José, 28 anos, está em greve de fome até conseguir emprego
"Por um emprego e um futuro digno", o designer de comunicação de 28 anos está em greve de fome na rua de Santa Catarina, no Porto. Aos pais só falta “pedir uma família e filhos”
Está de cabeça baixa e com uma resma de papéis na mão, sentado num banco amarelo. José Eduardo Cardoso protesta contra a situação do país e contra a sua própria situação. “Por um emprego e um futuro digno”, está em greve de fome até conseguir um emprego ou até conseguir falar com o primeiro-ministro português, Pedro Passos Coelho.
Cansou-se de enviar currículos e portefólios e não receber respostas, nem positivas nem negativas. Há alguns meses, decidiu criar o próprio emprego — o projecto “A Thousand Faces Starring Back at You” onde desenha uma caricatura por um euro —, mas mesmo assim não foi suficiente. É designer e ilustrador, já trabalhou em vários estúdios e integrou o colectivo Salão Cóboi.
Aos 28 anos, não quer depender mais dos pais. “Só lhes falta pedir uma família e filhos”, diz. “Tenho quase 30 anos e os meus pais pagaram-me a faculdade e o alojamento, não é justo.” Não informou a família da sua decisão, para evitar preocupações, mas acredita que por esta altura já devem saber. “Sei que me iam apoiar, apoiaram-me sempre, mas iam tentar demover-me, claro.”
Na rua de Santa Catarina, no Porto, o designer de comunicação, licenciado pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, vai manter-se em greve de fome. José Eduardo quer que algo mude “ou, pelo menos, ficar com a consciência tranquila”. “Até à semana passada não tinha coragem para tomar esta decisão”, conta, mas depois de um fim-de-semana em família em que as conversas à mesa se centraram nas dificuldades do país, avançou. “Custa-me ver os meus pais assim, a culpa desta situação não é deles.” A comunicação ao país do primeiro-ministro, na última sexta-feira, foi o “empurrão” de que precisava.
Estipulou consigo mesmo que ia estar em Santa Catarina, em frente a uma conhecida confeitaria, das nove da manhã às sete da tarde, até porque continua a ter alguns — poucos — compromissos profissionais. Se um destes dias chegar a casa e tiver uma resposta positiva no e-mail ou receber um telefonema, dá por terminado o protesto que diz ser “completamente pacífico” e que espera ser breve.
Coragem para decisões certas precisa-se
José Eduardo Cardoso continua a trabalhar como freelancer, numa destas três situações: “uns não pagam, outros pagam passado meio ano e outros, ainda, pagam um terço do valor justo”. Já se viu obrigado a mentir quanto às suas qualificações, já se inscreveu em agências de trabalho temporário e no centro de emprego, sem frutos.
Ainda não pensou a sério em emigrar. Acha que não tem de deixar tudo para trás só porque um grupo de pessoas tomou decisões erradas. Concorreu a vários lugares no estrangeiro, mas as respostas também não chegaram.
Na rua, onde está há um dia só com uma garrafa de água com açúcar como alimento, já ouviu de tudo. “As pessoas que param para dar apoio são aquelas que têm consciência que as coisas estão erradas. As outras, que me ignoram, também ignoram o resto”, considera. Há as que já o conhecem e que partilham histórias de filhos, primos ou conhecidos em situações precárias, desempregados.
“Gostava que as pessoas responsáveis por esta situação tivessem metade da coragem que eu, a minha família e milhares de outras pessoas têm para poderem tomar decisões acertadas. Porque uma decisão errada não só é produto de inconsciência como também de cobardia”, reflecte. “Peço ao doutor Passos Coelho, como representante dessas pessoas, que esqueça a sua agenda preenchida com decisões erradas, que tenha a coragem e o bom senso de me pedir para parar com isto pessoalmente.”
Fonte: Público
*sublinhado meu.
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